sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O meu apagão.

Como de praxe todo final de ano o trabalho aumenta de uma forma extraordinária, numa correria desenfreada para atender aos inúmeros clientes e aos pretendentes que nos procuram solicitando nossos serviços e como todo bom brasileiro que se preza, sem nenhum planejamento, deixando tudo para a última hora e depositando em nossas mãos seus "explosivos" para desarmarmos, situação que muito nos enobrece, pois graças a eles aumentamos o nosso curto período de sono, a irritabilidade, os cabelos prateados, esgotamento físico e pontos a menos na qualidade de vida, resumindo, uma arca com diversos “tesouros” do gênero chamado stress.

O que considero o mais interessante em tudo isto é que para quem está solicitando os serviços sou considerado um super-herói, o que muito me deixa lisonjeado, pois além de resolver o problema alheio, não preciso me alimentar, dormir, descansar, praticar uma atividade física, nem ter uma vida social, pois minha missão é salvar a pele dele. Uau, sempre quis ser um super-herói!!!

Todos os dias recebo várias mensagens com diversas missões que após lê-la ela se destrói em 5 segundos e eu em seguida..rs.

O mais interessante são os sentimentos antagônicos, pois também me sinto em uma cela carcerária (escritório) onde o trabalho escravo é interminável...rs.

Num determinado dia recebi uma missão de participar de uma concorrência em um projeto para uma grande empresa conhecida mundialmente com entrega para o dia seguinte (é claro). O vencedor assinaria um contrato de assessoria por 24 meses com exclusividade, o que não é nada mau, mas o único tempo viável para estudá-lo e prepará-lo seria após o expediente, o que já é comum no dia-a-dia, só que este iria varar até a manhã seguinte.

Como um super-herói presidiário, aceitei mais este desafio.

Apressei para concluir com as outras missões e focar neste projeto, isso já era em torno das 20 horas. Com toda a atenção e cuidado comecei a elaborar o tal projeto e quando estava com um terço dele elaborado começou a luz a piscar de forma estranha e pronto, tudo escuro!

Fui até a portaria do prédio para ver se era apenas na minha rua, mas apenas enxergava a lua. O porteiro me disse que devia ser em boa parte da cidade, pois a namorada dele que mora no lado oposto havia ligado e disse que estava tudo escuro, um amigo que passou em sentido contrário disse que do outro lado também estava. Resolvi ligar para a portaria do prédio onde moro para saber se lá havia acabado também, pois moro no 13º andar, a resposta dele não poderia ser mais animadora: “Estou indo tirar um pessoal que ta preso no elevador”...

Diante de todas estas informações resolvi ligar o meu laptop que não precisa de energia e entrei no UOL para descobrir se havia algo “estranho”, quando li: “Pane em Itaipu deixa Minas, Rio e São Paulo sem luz”, este era apenas o início das informações que chegavam, pois no dia seguinte saberíamos que seriam 18 estados brasileiros atingidos.

Com o quebra-cabeças montado, a temperatura em torno de uns 33 graus, olhei para o Ricky (meu cachorro Shitsu), minha mochila com o laptop e apetrechos, um saco com 3 litros de leite, outro de pão e uma lanterna com pilha fraca (o que acrescentou em meu peso de 8 a 10 kg), suspirei, sorri e fui para casa encarar 14 andares de escada (contando com o sub-solo, é claro.)

Quando estava pelo 8º andar parecia que alguém puxava a minha perna para baixo, o Ricky lambia o chão, nunca vi uma língua tão comprida...rs.

Cheguei que era um trapo ambulante, suado, derretendo, moído, com fome e sem saber se havia perdido parte do projeto. Após recompor-me fui ligar o fogão, mas como ele é elétrico, tive que fazer uma manobra espetacular para acendê-lo com o fósforo.

Depois de todo este roteiro sentei na varanda e olhei para a cidade toda apagada, um breu só, quando me vieram algumas conclusões à cabeça:

1- Estamos nas trevas e cozidos. Se for analisar o que nos dá a luz é o fogo, de dia é o Sol, de noite é a energia elétrica que também queima, ou a vela neste caso.
O Sol transmite o calor que nos derrete feito sebo, amolecendo, envelhecendo. Sem ele é treva pura (nem sei se posso chamar “treva” de pura, sendo que significa ausência de luz);

2- Nascemos neste mundo escravos da matéria, pois para sobreviver temos que trabalhar e ganhar o pão nosso de cada dia, além de sermos submissos aos seus caprichos, necessidades, gostos e vontades;

3- As pessoas, na grande maioria, só enxergam o próprio umbigo, querendo resolver o seu problema, sem lembrar que existe um ser humano igual a ele e que não deve ser tratado como um super-herói;

4- O mundo chamado “civilizado” existe para lapidar as pessoas com o seu progresso, conforto que faz com que a pessoa fique refém deste sistema, cada vez mais sedentária e dependente de tecnologia. Este mesmo mundo maravilhoso que ilude, emociona, magnetiza com sua mídia consumista, alimentando o desejo de todos em adquirir os bens que supostamente trará prazeres, atinge a todos que se encantam, inclusive os que não tem estrutura, deseja e como não tem acesso, além de alimentar a inveja parte para a criminalidade, invertendo valores, trocando uma vida por um bem material qualquer.

5- A civilização chegou ao seu apogeu, ao amadurecimento e como tudo depois de maduro começa a apodrecer, é que estamos presenciando tudo isso, inclusive a falência física, moral e financeira. A grande maioria trabalha para sobreviver e não por ganância.

Estamos numa fase de salve-se quem puder e se puder!

Citei 5 entre tantas outras reflexões que o leitor também fazer com esta leitura, mas, isto deixo por conta de cada um. É um excelente exercício!

Este apagão me fez lembrar o Maurício, um pianista cego de Minas Gerais, que em certo dia, tocando em um jantar, acabou a energia local e todos os presentes no salão pararam inclusive os garçons e cozinheiros, mas a música não.

Assim como o Maurício deveríamos ter a nossa “luz própria” e continuarmos sendo nós mesmos independentemente do que acontece ao redor (luz própria é sinônimo de autoconhecimento).

Esta é uma simples metáfora que esclarece a necessidade de nos conhecermos de verdade e sermos fiéis aos "nossos princípios"! O que são realmente "nossos" e o que quer dizer "princípio"? Analise e tire as suas conclusões.

Ah, quanto ao projeto eu conto numa próxima...rs

2 comentários:

  1. Na sua reflexão você citou: a inércia cega que se vive o “dia a dia”; a dependência que a luz artificial (física/elétrica) exerce nas pessoas ; viver a vida mecanicamente sem saber o porque se vive realmente; o egocentrismo que impede de enxergar o “outro”; a dependência material atrelada a inversão de valores...em fim...a falência do ser humano que está se “afogando” em uma piscina rasa!
    Acrescentaria o “falso moralismo” tão comum na política, no trabalho, “religiões” e entre os seus seguidores, nas relações “simples” entre as pessoas que se tornam insuportáveis, TUDO isso resultando no DESENTENDIMENTO GERAL!
    O autoconhecimento exige: enfrentamento consigo mesmo, limpeza dos armários internos cheios de valores inúteis, mentiras que criamos para nos proteger não sei do que e servem somente para nos iludir e confundir, é necessário encarar os nossos “medos”, dissipar as nossas “angustias”, em fim... limpar o corredor de “tudo” que impede a passagem e fortalecimento da nossa “própria luz”...clareados!
    Quanto a “nossos princípios”, acho que este faz parte com o “Universo”, pois tem haver com o “início” de tudo! Portanto, não é “nosso” é “cósmico” é de “Deus”!
    A nós cabe enxergar, conhecer, compreender e sentir tudo isso transformando-nos em seres mais estáveis, equilibrados e harmoniosos com os nossos semelhantes, nosso planeta com a própria vida!

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  2. realmente nossos...creio que os sentimentos...os valores que trazemos e os que acrescentamos em nossa alma...

    abraços em sua querida pessoa e Cia!

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